O PRESBITÉRIO E A MISSÃO DE RECUPERAR A OBRA DE DEUS
POLUÍDA PELA INSENSATEZ HUMANA.
Prezados seminaristas
Já refletimos nesta semana missionária que a Igreja de Jesus Cristo é essencialmente missionária. Ou seja, a missão não é, em primeiro lugar, uma atividade, mas é essência. E nesta vivência eclesial, somos chamados a alimentar nossa espiritualidade presbiteral que é fonte desta missão. Missão que se torna visível no dia-a-dia em nossas paróquias através do nosso serviço pastoral, em que devemos ter como modelo Jesus Cristo Bom Pastor, que dá a vida por seu rebanho. Este presbítero é gestado dentro do Seminário, que é chamado a ser celeiro de vocações missionárias. Somos chamados a cultivar aquilo que somos em nossa essência pelo batismo: ser missionário. E hoje queremos voltar nosso olhar sobre a missão do Presbítero de recuperar a obra de Deus poluída pela insensatez humana.
Esta recuperação da obra de Deus só e possível devido a Encarnação de Jesus Cristo. A Redenção começa na Encarnação. Cristo Senhor é o Redentor do homem. A Encarnação-Redenção é o mistério de Cristo entrelaçado, num movimento de interação recíproca. Redimir significa recuperar algo perdido, ou oferecido, comprar de novo, readquirir, resgatar, tomar a possuir aquilo que já era seu. Pelo pecado, o homem tinha perdido – jogou fora – seu direito de herança à união eterna com Deus, à felicidade no céu. O Filho de Deus feito homem assumiu a tarefa de recuperar esse direito para nós. Por isso o chamamos Redentor, e, à tarefa que realizou, redenção. Redenção é resgate. É libertação. Restabelecimento da amizade com Deus com a ênfase no aspecto de resgate. É a recuperação da graça de Deus que Cristo obtém para os homens mediante o preço da sua paixão. Para Jesus poder entregar sua vida em resgate por nós, foi preciso antes fazer outra coisa maravilhosa: encarnar-se.
Ao celebrarmos a memória de Nossa Senhora do Rosário, queremos, com Maria, a Mãe de Deus e, sobretudo, através do seu “sim”, que a nossa atenção se volte para Jesus e com Ele percorramos a trajetória de Sua vida: encarnação, ministério em sua vida pública, Paixão e ressurreição.
Com base nesta missão de recuperar a obra de Deus poluída pela insensatez humana que se manifesta através do fechamento à graça de Deus, poderíamos perguntar: qual a missão do presbítero diante desta realidade?
Dom Hélder Câmara, profeta da paz, dizia que o presbítero não existe para si mesmo e que o ser padre é incompatível com o egoísmo. O egoísmo, por sua vez, esvazia o sentido da missão. Um presbítero egoísta é um desastre para a Igreja, pois o ser presbítero está voltado para o serviço e ninguém serve a si mesmo, mas ao outro. O sentido autêntico do ministério presbiteral está no serviço ao povo de Deus. O chamado é para ser operário. Jesus não chama para a administração, nem para a posse da vinha, mas para o trabalho na vinha.
O padre é homem do povo para Deus e homem de Deus para o povo. Cabe-lhe unir, ligar a humanidade e Deus, fazer ponte, ser pontífice. O padre é convocado a destruir muros e construir pontes. Assim se expressa o cardeal Walter Kasper: “O serviço sacerdotal é um serviço de unidade. Apenas secundariamente é uma tarefa organizacional. O decisivo é que se trata de uma tarefa espiritual; o presbítero deve juntar todos em torno do único pastor Jesus Cristo e manter o rebanho unido numa só fé, num só amor e numa só esperança”.
A missão do presbítero é essencialmente um tornar-se próximo – e um aprender a tornar-se próximo – aos outros, aos pobres, às vítimas da sociedade, aos caídos.
Missão é, antes de mais nada, se despojar de tantos elementos que constituem a pureza de nossa identidade para nos aproximar dos outros. É uma quênose que nasce da compaixão e da aproximação e não do desejo de ascese: isso é fundamental para o cristianismo. A Missão convida a pessoa a sair de si, da sua tribo e da sua “terra”. Jesus não vacila diante do mestre da lei: “vá, faça a mesma coisa [que fez o samaritano], e viverá” (Lc 10,37). É possível amar a Deus somente amando o próximo.
O Documento de Aparecida assim expressa sobre a missão: “A vida se acrescenta dando-a, e se enfraquece no isolamento e na comodidade. De fato, os que mais desfrutam da vida são os que deixam da margem a segurança e se apaixonam pela missão de comunicar vida aos demais (...) Aqui descobrimos outra profunda lei da realidade: Que a vida se alcança e amadurece à medida que é entregue para dar vida aos outros. Isso é, definitivamente, a missão” (DA 360).
Como afirma João Paulo II na encíclica Redemptois Missio, “impõe-se uma conversão radical da mentalidade para nos tornarmos missionários, e isto vale tanto para os indivíduos como para as comunidades” (RM 49).
A partir de uma intuição profundamente missionária e aberta ao mundo, a Igreja na América Latina é chamada a repensar a si mesma e à sua missão. Essa missão convoca para uma conversão profunda: “A conversão pastoral de nossas comunidades exige que se vá além de uma pastoral de mera conservação para uma pastoral decididamente missionária. Assim será possível que ‘o único programa do Evangelho continue introduzindo-se na história de cada comunidade eclesial’ com novo ardor missionário, fazendo com que a Igreja se manifeste como mãe que vai ao encontro, uma casa acolhedora, uma escola permanente de comunhão missionária” (Documento de Aparecida – DA 370).
Como diz Dom Hélder: “Missão é, sobretudo, abrir-se aos outros como irmãos,
descobri-los e encontrá-los.”.
Sendo assim, a missão nasce do amor: a missão é caridade, relações fraternas e verdadeiras, simétricas e dialógicas, estendidas a todos, sem excluir ninguém. Neste sentido, a perspectiva da “paróquia missionária” pode representar um caminho de renovação para a comunidade eclesial.
Portanto, precisamos do amor. Se não é animada pelo amor, a missão se reduz a atividade filantrópica. Precisamos seguir a exortação do Apóstolo Paulo: “O amor de Cristo nos impele”.
Ou seja, a missão é um sair de si mesmo e ir ao encontro do outro, para levarmos o Cristo para ele, mas deve ir além: através do Cristo que habita em mim, ajudar o outro a perceber que Cristo habita nele.
A Igreja tem tem raiz no Deus Uno e Trino, que desde o início deseja a felicidade da criação.
Por isso, nossa missão é:
- louvar a Deus pelas maravilhas que criou
- cuidar da obra de Deus saqueada pela cobiça humana
- respeitar os ritmos da obra de Deus.
- e ajudar a recuperar a obra de Deus poluída pela insensatez humana
Por isso, vos pedimos:
Deus-Pai,
Criador do céu e da terra,
Enviai, por meio do vosso Filho,
O Espírito que renova todas as coisas,
Para que, no respeito e cuidado com a natureza,
Possamos recriar novos céus e nova terra,
E a Boa-Nova, que brilhou na Criação,
Seja conhecida até os confins do universo.
Amém.


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